Vários motivos
contribuíram para o incêndio que matou mais de 230 jovens na boate Kiss,
em Santa Maria, no Rio Grande do Sul. A banda usou material inflamável
durante sua apresentação, na madrugada deste domingo, e seguranças
mantiveram a porta principal trancada no início das chamas. Além disso, o
estabelecimento estava com o plano de prevenção contra incêndio vencido
desde agosto do ano passado.
No final da manhã, o comandante
geral do Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul, coronel Guido Pedroso
de Melo, afirmou que a porta principal da boate Kiss estava trancada na
hora do incêndio.
De
acordo com o jornal “Zero Hora”, jovens que conseguiram escapar da casa
noturna relataram às autoridades que, no momento do fogo, seguranças
teriam tentado impedir a saída das pessoas, porque acreditavam que a
agitação das pessoas para sair da boate tinha como intenção evitar a
cobrança. A Polícia Civil disse que vai investigar as denúncias.
—
Grande parte dos mortos estavam amontoados perto da saída. A maioria
morreu por asfixia. Lamentavelmente, as pessoas ficaram confinadas
porque a saída principal estava trancada — disse Guido ao canal
“GloboNews”.
O estudante de medicina Murilo De Toledo Tiecher, 26
anos, contou ao "Zero Hora" que os seguranças não entenderam o que
estava acontecendo e tentaram barrar a saída dos jovens que estavam na
festa.
— A gente gritou 'tá pegando fogo, tá pegando fogo', mas o
segurança abriu os braços e estava tentando manter a porta fechada. Uns
cinco ou seis caras derrubaram o segurança e colocaram a porta abaixo.
Foi a única saída — disse ao jornal.
Em seu perfil no Facebook, o
jovem complementou: "Eu fui uns dos 50 primeiros a sair, no inicio do
tumulto tentaram segurar as portas com os seguranças e manter as pessoas
ali pra que nao saíssem da boate! Não sei se pensavam que era uma briga
e não queriam que saíssem sem pagar (...)".
Já Lucas Cauduro Peranzoni, 31 anos, o Dj Bolinha, afirma que não houve trancamento da saída por parte dos seguranças.
—
Todo mundo estava se empurrando. Respirei aquela fumaça e fiquei tonto.
Caí na porta e os seguranças, me puxaram para fora. Não houve
trancamento da porta. Foi uma contenção de cinco segundos, e quando
gritaram que era fogo eles abriram.
Plano de prevenção contra incêndios vencido
A danceteria Kiss estava com o Plano de Prevenção e Controle de Incêndios vencido desde agosto de 2012. A informação,
disponível no site do jornal "Zero Hora", é do subcomandante-geral da Brigada Militar, o coronel Altair Cunha.
—
Os proprietários tinham pedido renovação do PPCI, mas ela ainda não foi
concedida. É normal que se permita o funcionamento, enquanto espera a
fiscalização verificar o novo plano, já que eles tinham um plano
anterior aprovado — explica Altair.
O coronel confirma que a
entrada e a saída da danceteria eram uma só. Ele diz que, apesar disso, o
funcionamento pode ser autorizado quando os proprietários do
estabelecimento comprovam que a largura dessas vias de acesso é
suficiente para deixar passar um grande número de pessoas, o que seria o
caso da Kiss.
— Tem de checar agora outras coisas: se as portas
foram abertas na hora da confusão, como deveriam. Se os extintores
funcionaram e assim por diante — ressalta o subcomandante da BM.
Testemunhos
colhidos pela Polícia Civil indicam que as portas de saída não estavam
totalmente abertas, na hora em que o incêndio começou a se propagar. Por
isso, muita gente teria buscado refúgio nos banheiros, onde acabou
morrendo por asfixia ou pisoteada.
Asfixia
A
asfixia por confinamento, causa alegada da morte das mais de 200
pessoas na bote Kiss, pode matar em até cinco minutos. Segundo a
pneumologista Margareth Dalcolmo, pela falta de saídas de saída de
emergência e pela quantidade de material sintético, a boate era uma
ratoeira.
— Essas boates, como a maioria dos ambientes, têm
quantidade grande de material sintético, como plástico, isopor e
substâncias que têm composição completamente não natural. Um ambiente
fechado, sem ventilação, sem entrada de oxigênio e grande emissão de
moléculas particuladas, é altamente letal — explicou.
A morte,
nessas circunstâncias, pode ocorrer em três a cinco minutos, dependendo
da concentração de moléculas particuladas que penetram nos pulmões.
—
O que mata é a partícula invisível, aquelas partículas muito pequenas
decorrentes da combustão de substâncias sintéticas. Isso, somado a um
ambiente sem oxigênio, fez com que as pessoas entrassem num estado de
narcose, em que a pessoa não consegue andar, não consegue fugir. As
pessoas morrem porque não tem saída no lugar, ficam em pânico - completa
a pneumologista que, há 11 anos, atendeu as crianças vítimas no
incêndio no estúdio do programa Xuxa Park, no Rio de Janeiro. A
diferença entre os dois casos, segundo ela, foi o tempo de permanência
das pessoas no local.
— Lá não morreu ninguém porque a retirada
das pessoas foi muito rápida, havia saídas de emergência.. O tempo é
muito curto para salvar uma vida — completa.